inscrição
quando eu morrer voltarei para buscar os instantes que não vivi junto do mar.
sophia de mello breyner, livro sexto (1962)
[sem título]
na sua forma mais sublime a música detém um poder universal que lhe advém da forma prodigiosa como se insinua no mais profundo dos códigos misteriosos pelos quais o corpo transmite os seus sinais ao cérebro.
assim, o cérebro trata as mensagens musicais como se elas viessem do coração e não do ouvido. esta música apropria-se da transmissão e chega ao cérebro não somente enquanto som, mas também como sentimento puro.
[...]
o espírito do ouvinte privilegiado tem a sensação de estar a escutar às portas da sua vida interior, de estar ligado à fonte da existência, longe, bem longe, do quadro mundano da experiência.
antónio damásio, le voyage magnifique (1997)
é um dizer
estende um pouco mais a mão
recolhe um a um os sinais do desejo
fogo de abelhas o sexo
espera a insurreição da cal
a espessa ondulação do vento
é sobre o corpo a própria exaltação
morrer nos flancos do amor é um dizer
repara como brilham os limoeiros
eugénio de andrade, véspera da água (1973)
[dedicatória]
in the vastness of space and the immensity of time, it is my joy to share a planet and an epoch with annie.
carl sagan, cosmos (1980)
you are welcome to elsinore
[...]
e há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita
[...]
mário cesariny, pena capital (1957)